A criança brinca desde os primeiros dias de sua vida, inicialmente brinca apenas com os olhos e movimentos de cabeça, depois vai aos poucos inserindo seu corpo neste brincar e vai percebendo que tem capacidades ilimitadas, que quanto mais ele brinca mais poderá aprender a lidar com aquele corpo que se antes parecia ligado a outra pessoa como foi nos nove meses que assim esteve com sua mãe, porém agora ele já não é mais aquela, agora é essa.
Esse comportamento lúdico infantil passa despercebido pelo mundo dos adultos, ou então se percebido é considerado irrelevante, pois sempre que queremos ensinar algo a uma criança o fazemos em um tom sério, impositor indo contra a premissa de Rousseau que dizia; se quiser ensinar algo a uma criança, invente um jogo.
Contudo, apesar de os adultos não perceberem esse brincar permanente, nem tampouco sua relevância na construção do conhecimento da pessoa através do brincar, a criança brinca e aprende aquilo que é necessário naquele momento para ela. Na visão de Ferland sobre o brincar na infância, esta elencou sua relevância determinada por períodos de sua vida ou seja, em determinados momentos o brincar é desenvolvido de certa maneira e com uma escala hierárquica de aprendizagem.
Nesta visão a criança dos zero aos dezoito meses descobre seu próprio corpo, inicialmente amplia sua visão, aprende que é um corpo separado daquele que se imaginava junto a mãe. Com movimentos ainda rústicos e reflexos passa a reconhecer seu corpo, suas mãos, seus pés, boca orelha e outros componentes através do desenvolvimento motor que vai ocorrendo aos poucos.
Conforme seu domínio motor vai se estabelecendo, e a criança percebendo suas capacidades, vai ampliando a visão de suas potencialidades na observação das outras pessoas e vai aprendendo o que poderá fazer e ser. Então o controle do seu próprio corpo vai dando a ela a liberdade de interagir com objetos que a rodeiam.
Os móbiles fixados acima do seu corpo que podem ser alcançados e tocados, objetos deixados no berço ao alcance das mãos, os quais agora ela passa a perceber suas diferenças através o brincar com eles. Sua textura, sua forma, se oval, quadrada, fina, grossa, lisa, áspera, macia, dura, e assim em diante.
Neste interagir e brincar com esses diversos objetos ela desenvolve sua motricidade fina, sua capacidade de prensão, a utilização do polegar opositor, o controle motor mais refinado, a ampliação das potencialidades, a noção da sua capacidade de locomoção no espaço, a potencialidade do andar, inicialmente rastejando e engatinhando onde ela brinca de rolar, deitar e levantar e progressivamente a ter o domínio do próprio corpo e do espaço que este ocupa.
Ainda na visão de Ferland, dos dezoito meses aos três anos a criança passa a ser o grande explorador. Nessa idade a curiosidade se acentua o conhecimento de mundo fica mais abrangente, ela percebe um maior número de pessoas ao seu redor e para entender esse mundo e conviver com ele passa a brincar sozinha, dentro do que Ferland denomina a microsfera. A criança passa a brincar com a imaginação, criando símbolos para todo objetos que interage, atua no mundo do jogo simbólico onde um pedaço de pau se transforma em um microfone, em um cavalo, em uma espada ou em qualquer coisa que ela imaginar. Ela passa a se interessar por enriquecer mais sua linguagem, gosta de ouvir histórias e intervir naquelas que já conhece, as fantasias que antes a amedrontavam agora povoam seu mundo e já não assustam mais, ela vai aos poucos se desligando da microsfera, interagindo mais com outras crianças, ampliando seu mundo social e inicia após os três anos o período da macrosfera na visão de Ferland.
Nesse período ela brinca mais com objetos e com outros seres, passa a ter um controle motor maior e um melhor domínio sobre si mesmo. Começa a aprender a controlar o equilíbrio na bicicleta, dominar atividade de cortar com tesoura, entende o funcionamento dos objetos, a bola rola, os cubos são estáticos entre outros.
Nessa fase de desenvolvimento ela entra no mundo da associação de objetos e cria os jogos associativos. A interação entre os objetos e entre as pessoas um no auxilio do outro, e ainda na construção coletiva do brincar, percebe a importância do jogo cooperativo onde um agrega valor e significado ao desenvolvimento do outro, amplia seu mundo social, e neste momento é onde ela brincando iniciou seu mundo como ser humano, como ser social, como um ser com capacidades de desenvolver as inúmeras potencialidades que até agora percebeu no mundo dos adultos.
Aqui também, nesse momento crucial de sua vida é o momento que ela inicia sua jornada escolar, é quando entra na escola, é quando ela vai a um lugar para aprender, como se até agora ela não tivesse aprendido nada, é como se ela não tivesse aprendido a viver, a ser humano, a ser gente. E é aqui também, na escola que a brincadeira termina.
Portanto, no ponto mais alto do desenvolvimento humano, no auge do aprender brincando, a escola retira dela esse potencial e transforma o aprender em algo serio, em algo que não comporta o brincar, e isso é um choque para as crianças.
Essa situação constrangedora para a criança é gerada pela falta de capacitação dos professores no entendimento da capacidade do jogar e brincar no processo de aprendizagem do ser humano. Apesar de muito ter se falado em educar através de um modelo lúdico, ainda não estamos preparados para entender como o brincar pode ocorrer em sala de aula de forma pedagógica. Alguns paradigmas da educação são conflitantes com o brincar no processo pedagógico, tal como para aprender algo é necessário silencio, enquanto que criança brincando faz muito barulho. Na escola barulho e aprendizado estão separados, alunos devem estar sentados em suas cadeiras desenvolvendo atividades sozinhas, isoladas e sem barulho.
Maria Montessori idealizou uma escola onde as crianças pudessem andar livremente pelo ambiente, interagindo com os outros, dando idéias, captando idéias e flutuando na Zona de Desenvolvimento Proximal de Vygotsky. Já Decroly indo um pouco mais além, entende que o aluno deveria desenvolver aquilo que tem interesse imediato fosse qual assunto fosse do seu interesse, o aluno seria o agente da produção do seu conhecimento ou seja, teria que aprender a aprender.
A busca do equilíbrio dentro da sala de aula, o controle dos alunos por parte do professor, dentro da atividade do brincar, é o que torna difícil a estratégia de aprender brincando. Na visão de João B. Freire, o senhor do jogo tende a tomar conta da situação fugindo do controle do professor e saindo da esfera pedagógica entrando no mundo da anarquia.
Porém, ao introduzirmos em sala de aula uma brincadeira pedagógica objetiva, motivadora e interessante aos alunos, onde cada grupo desenvolverá uma tarefa diferente e então após seu termino terá a responsabilidade de transmitir o que aprendeu aos seus colegas interagindo com eles dentro do espaço multidisciplinar, dará uma relevância ao assunto onde mesmo brincando haverá o controle da situação, mesmo que o barulho se faça presente. Este aprendizado será interligado com temas interdisciplinares os quais mostrarão o sentido significado do aprendizado dentro e uma contextualização entre os grupos, o que tornará a aula mais interessante e trabalho profissional mais facilitado e com melhores resultados.
Um modelo de brincadeira para ser desenvolvida em sala de aula e que o professor poderá atuar na construção do brinquedo e do jogo dirigindo aos níveis de conteúdos elencados no currículo pode ser “O Sitio do Vovô Bastião”.
Este é um modelo simples, porém poderá auxiliar no inicio da compreensão de inserir o jogar e o brincar no ensino regular.
Referências
FERLAND, Francine. O Modelo Lúdico: o brincar e a criança com deficiência física e a terapia ocupacional, Roca 3ª Ed. São Paulo – 2006
FREIRE, J. Batista – O jogo entre o Riso e o Choro, Editores associados 2ª Ed. Campinas - 2005
http://revistaescola.abril.com.br/historia/pratica-pedagogica/pai-didatica-moderna-423273.shtml
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